1. Os acusados, com intuito de realizar “um trabalho”, ingressaram, por volta da meia-noite, no cemitério de Passo Fundo. Uma das co-rés, com a mãe doente, havia buscado auxílio numa “casa de umbanda”. Esta, foi apanhada em sua residência, em automóvel dos co-réus, e conduzida ao cemitério. Lá chegando, enquanto a beneficiada pelo trabalho segurava uma lanterna e era amparada pela co-ré, os dois acusados removeram as lajes de uma sepultura, onde havia sido, há poucos dias, enterrado um homem de 87 anos de idade. Após, abriram o caixão, fizeram uma incisão no abdome do cadáver, sacrificaram um cachorro e uma galinha sobre o corpo do enterrado, nele introduzindo vários papéis. Em seguida, despejaram álcool sobre o cadáver, atearam fogo e fecharam a sepultura. Tudo foi acompanhado pelo acendimento de velas, ao lado da sepultura e iluminação de lanterna, à meia-noite.
2. O alegado “transe mediúnico”, eventualmente existente e ainda que presente, em face da dimensão existencial em que se labora nos processos, não é excludente de tipicidade, ilicitude e nem de culpabilidade.
3. Prova consistente nos autos, inclusive pericial e fotográfica, onde se pode ver, querendo, o ataúde avermelhado, a galinha vermelha e preta, os restos das velas queimadas, as flores que adornam o túmulo, a face do morto, enegrecida pelo fogo, bem como os restos, aos pedaços, dilacerados, do cadáver. No interior do caixão, também se pode ver um cachorro e uma galinha, ambos mortos e queimados, junto com o cadáver. Ainda, a completar a cena dantesca e tétrica, foram encontradas uma garrafa de vodca e outra de plástico, parcialmente derretida. Condenações mantidas.
APELOS DEFENSIVOS DESPROVIDOS.
Apelação Crime - Sétima Câmara Criminal
Nº 70014529440 - Comarca de Passo Fundo
ELEANDRO JOSE COLUSSI - APELANTE
LUIZ ADAIR RICARDO DOS SANTOS - APELANTE
REJANE DE FATIMA PEDROSO CASTANHO - APELANTE
MINISTÉRIO PUBLICO - APELADO (...)
Em juízo, a co-ré confessou as práticas delituosas e contou o seguinte: “(...) À época dos fatos, a depoente começou a frequentar a casa de umbanda de João Luiz Maciel Medeiros, que é pai-de-santo. Fez isso, porque sua mãe estava doente e achou que poderia conseguir ajuda para a cura. Naquela casa, conheceu os denunciados ELEANDRO, LUIZ ADAIR e REJANE. Num dos encontros, LEANDRO disse para a depoente que faria trabalho no cemitério que ajudaria a curar a mãe da depoente. Na noite do fato, os acusados ELEANDRO, LUIZ e REJANE foram de carro até à casa da depoente. Quem dirigia era ADAIR, que levou todos até o Cemitério Santo Antônio. Lá chegaram por volta da meia-noite. Entraram pelo portão principal (...) Saíram do carro e foram diretamente à sepultura violada. Ali chegando, a depoente foi encarregada de segurar uma lanterna. O réu ELEANDRO disse que havia incorporado uma entidade (...) ELEANDRO e o réu LUIZ ADAIR removeram as pedras da sepultura e depois abriram o caixão. A partir daí, a depoente ficou apavorada e começou a desviar os olhos (...) Ficou assustada, pois não havia combinado com ELEANDRO o que aconteceu. Durante o ritual, a ré REJANE permaneceu ao lado da depoente e lhe segurou um dos braços. Viu quando ELEANDRO tirou do bolso alguns bilhetes. Por fim, a sepultura foi fechada e todos saíram do cemitério (...) Viu quando ELEANDRO ateou fogo no cadáver, antes de fechar a sepultura (...) Logo que chegaram ao cemitério, a depoente e REJANE acenderam velas ao lado da sepultura, a pedido de ELEANDRO (...)” - fls. 65 a 66.
O depoimento de CLARICE deu detalhes das condutas individuais, relatando que ELEANDRO e LUIZ ADAIR removeram “as pedras da sepultura”. Depois, ainda em conjunto, removeram a tampa do ataúde. Referiu que foi realizada incisão no cadáver, embora não tenha visto quem tenha feito, pois a depoente “ficou apavorada e começou a desviar os olhos”, conquanto por demais dantesca era a cena.
A alegação trazida ao recurso de falta de prova para a sustentação da condenação não procede, em face do depoimento de CLARICE.
Outrossim, a defesa não trouxe prova da existência de animosidade da co-ré para com os demais acusados, caindo no vazio a alegação.
Por outro lado, o estado de “transe mediúnico”, eventualmente existente, não se constituiu em causa de diminuição de pena, de exclusão de ilicitude ou de culpabilidade e, muito menos, de absolvição, pela simples razão de inexistir previsão legal da circunstância, ainda que verdadeira.
O elemento subjetivo restou patenteado, na medida em que se trata de conduta comissiva que, por definição, persegue um resultado. Ademais, não existem tipos culposos dos fatos descritos na denúncia.
Ao fim, destaco que as testemunhas ouvidas em juízo nada disseram ao desate da questão da autoria, pois nenhuma delas estava presente aos fatos descritos na peça acusatória.
Em face do exposto, nego provimento ao recurso interposto por ELEANDRO JOSÉ COLUSSI, LUIZ ADAIR RICARDO DOS SANTOS e REJANE DE FÁTIMA PEDROSO CASTANHO, mantendo a sentença recorrida.